No processo, Rael visualiza memórias da sua vida com num imenso palco, entrando numa nova realidade. Tudo lhe é mostrado como não tendo valor ("Fly on a Windshield" e "Broadway Melody of 1974"), mas sua viagem continuará, tal como na descida ao Duat. A iniciação de Rael começa. Há um regresso ao inicio da sua existência, ainda no útero de sua Mãe – Cuckoo Cocoon – processo essencial para a resolução completa da sua personalidade. De seguida revê seu nascimento e o útero é visto como uma caverna (“In the Cage”). Já no exterior observa nossa realidade mundana: bebés (anjos) em camas com grades e “já sem asas”, como ele diz. Aí reconhece seu irmão gémeo John, que nascera primeiro. A descida ao corpo completa-se no final da música: “down, down, down”.
A vida no mundo começa, mas como Rael vê tudo já de 'fora', este lhe é revelado como ele de facto é, neste final de ciclo decadente que é a Kali Yuga: "The Grand Parade of Lifeless Packaging". Ou seja, O Grande Desfile das Coisas/Embalagens sem Vida, que somos nós e tudo o resto, assim manipulados pelo mundo que criámos. Como num palco no final de um grande espectáculo que é este fim de ciclo, Rael teve a sorte de assistir na plateia ao que ele próprio ajudou a montar.
Mas o tempo - não linear para Rael - mostra-lhe a sua infância em NY. Recordação essencial para o processo que ocorre no personagem: são os tempos da sua profana iniciação sexual, a sua primeira descoberta do potencial supra-humano através da descoberta da primeira paixão e do sexo. É o tempo do coração sem Amor mas loucamente apaixonado. É também o tempo de se iludir, mostrando a sua virilidade por pertencer a um gang de NY. São as músicas "Back in NYC", "Hairless Heart" e "Counting Out Time".
Terminou o tempo de recordar o passado profano. A primeira prova de Rael aproxima-se mas antes de esta começar, lhe é dada a primeira chave. Ele vê, claramente, toda a sua consciência naquela que foi a sua primeira célula, ainda em espermatozoide (solar), antes de se fundir com a célula receptáculo (lunar) na sua Mãe. Rael, com toda a sua consciência ainda no pai, apercebe-se que tem que entrar para poder sair. É a realidade de termos que ir para dentro de nós para nos libertarmos, assim expressa em "Carpet Crawlers" pela necessidade de todas as células-semente residentes no pai terem que entrar na mãe para poderem sair para a Luz... Ele vê um grande corredor, que sobe em espiral. Ele vê-se, à velocidade da luz, no seu ADN, que continua para além do físico, numa "staircase that spirals out of sight." - é Peter Gabriel invocando conceitos de Daniel Winter.
"The Chamber of 32 Doors". É a Árvore da Vida. São as 10 séfiras e os 22 caminhos. É o número cabalístico ao fim do qual se atinge o Grau Maior - o grau Solar - aquele que todas as árvores procuram alcançar na sua verticalidade, assim como tudo neste universo.
Rael, depois de sair do Pai há que voltar para ele. E como? Através da Mãe. A Mãe é "Lilywhite Lillith", uma mulher cega que lhe mostra entre o caos existente na “Câmara das 32 Portas” o caminho para o exterior desta, levando-o para a Luz, mas depressa escurece. Rael fica sozinho, sentado ao escuro enfrentando novamente seus medos, esperando (“The Waiting Room”), conformado (“Anyway”) por aquele que sabe que lhe vai infligir o golpe final, o seu herói: a Morte. Ele já vê seu corpo debaixo de terra, devolvido ao Universo.
Para que tal aconteça, três serpentes de aparência feminina (Lamias) limpam-no, degustando todas as suas impurezas e no fim, como se sempre o tivessem acompanhado, despedem-se saudosamente dele confessando terem amado-o desde o início. É assim que a primeira gota de sangue de Rael é ingerido por elas, as serpentes morrem e Rael compreende que para viver há que comer seus restos delas que ali ficam a flutuar. A luz é diminuída e o palco da iniciação - que continua - é de novo preparado e surge um novo cenário: "Silent Sorrow in Empty Boats".
O teste à Esperança de Rael continua. A solidão aumenta ainda mais e por fim, chega ao culminar do ritual. Vê aqueles que falharam mas que sempre pensaram que tinham conseguido. Aqueles que, apesar de iniciados, não percorreram o caminho pelos seus próprios pés e que viram o seu Ser estagnar e assumir em "The Colony of Slippermen" a forma mais hedionda que o Ser pode atingir: a daquele a quem lhe foram dadas todas as oportunidades mas que passou o tempo a 'escorregar', perdendo lutas atrás lutas contra o seu ego.
Rael, horrorizado com tais seres ali materializados, decide avançar e a morte do seu ego é simbolizada pelo mítico sacrifício por que todos os grandes heróis passaram: amputa o seu pénis (com tudo o que isso significa).
Pénis dentro de um tubo de ensaio é roubado das mãos de Rael por um corvo. Rael corre em perseguição ao corvo, mas seu Irmão john decide não se arriscar e fica para trás, Rael está de novo sozinho.
O corvo passa por um túnel deixando cair o tubo logo a seguir a uma falésia e este caindo dentro de água (é a fecundação das águas, num novo Génesis, após o Espírito – em ave - ter também as sobrevoado). É um rio.
Rael acompanha o rio lá de cima, caminhando à beira do desfiladeiro. Subitamente, no céu, uma janela abre-se e revela-lhe a Broadway, já sem a luz de outroura, onde para se ser uma estrela os passos a dar eram outros. Nesse momento, para Rael, claro, tudo isso já não tem qualquer significado. Passado esse último teste de tentação, Rael entretanto vê que o seu irmão John está no fundo do desfiladeiro, sendo arrastado pela água (“Rapids”) que corre com imensa força e, sem hesitar, salta do precipício para o salvar. Rael, neste último acto de amor pelo próximo e de pura fraternidade, está prestes a demonstrar que é pela dádiva desinteressada que se alcança a Liberdade.
Rael estica o braço conseguindo alcançar John e são dramaticamente arrastados pelos rápidos quase se afogando e, após um imenso esforço num local onde já estavam a salvo em águas calmas, se dá o climax da história, Rael olha para John e não vê seu irmão, mas sim a sua própria cara!
O momento do choque corresponde à elevação última e exponencial da sua consciência. É a transição espectacular da música "In The Rapids" para "It". O "It" é a realização total do ser que agora já não é Rael mas sim verdadeiramente Real. O Todo é compreendido pela expressão "It". Não há distinção entre as coisas. A Matriz, tal como no filme Matrix, fica compreendida. Rael foi o escolhido, tal como o Neo, o "Novo".
Texto de G.F., adaptado e publicado por BMC
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