segunda-feira, 22 de agosto de 2005

poemas que estão (iii)


Nós os dois, juntos, não precisamos
de sonhos, nem sagas, lendas, ritos
instrumentos de corda, não precisamos
de esmalte, estuque, porcelana,
é nítida a espiral
da ponta dos nossos dedos, abertura
auditiva sobreposta a uma concha
de carne, que tocada com as mãos
ou com a ponta da língua, irradia
em todo o lado a febre, o tremor,
o precipício do sangue, transparente,
deslumbrante é o sentido dos nossos
orgãos, claro o uso da respiração,
da saliva, dos dedos, das sombras
que escurecem o olhar, é certa,
sedante a profundidade dos caminhos,
os túneis, as reentrâncias, bela é
a superfície, a extremidade, a tinta
dos botões, da textura, da linha
da pele. Neste altar,
a bíblia são as nossas palavras
pedra, escapando de entre os lábios, a cisão
demente. Aqui, os deuses, todos,
emudecem atónitos,
aprendem connosco, espasmo após espasmo,
o alimento profano.

Andrea Inglese

Tradução: SC, 2005
SC

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