terça-feira, 16 de setembro de 2003

Os neurónios do Pacheco Pereira :-


A discussão em torno da quantidade de neurónios activos no cérebro de Pacheco Pereira despertou-me imensa curiosidade.

Primeiro, porque não é todos os dias que a discussão polí­tica atinge tão elevada elaboração linguística. Quero dizer, a expectativa é que os polí­ticos se chamem nomes uns aos outros, e não que elaborem a sua argumentação com recurso a palavras complicadas como "neurónio".

Segundo, porque o porta voz do CDS/PP terá dito que Pacheco Pereira só utiliza "metade dos neurónios" de cada vez que se refere a Paulo Portas. E isso fez-me deitar no sofá e elaborar uma questão profunda: Quanto é que é "metade dos neurónios". Será um? Serão dois? Ou 50 mil milhões?

Por fim, esta polémica leva-me a questionar sobre quantos neurónios terá Paulo Portas activos, quando fala "a Portugal e aos Portugueses".

Começemos pelo princípio. A palavra "neurónio" pertence a uma categoria muito restrita de palavras que perderam, por completo, o sentido na elaboração semântica do discurso político português. Entre outras, enquadram-se aí palavras como "inteligência"; "gestão"; "visão"; "planeamento"; "investimento" e "inovação".

Mas o recurso recente à palavra "neurónio" deixou-me optimista. Depois de já na passada semana o presidente do IEP se ter referido à "teoria do caos" para justicar a queda de uma ponte no IC19, já faltará concerteza pouco para termos o Manuel Monteiro a falar de "quarks", ou o Bagão Félix a falar de "buracos negros".

Mas se é verdade que a nossa relação com as palavras parece estar a melhorar, o mesmo já não se poderá dizer da nossa relação com os números.

Dizer "metade dos neurónios" é vago. Muito vago, até. E se a metade do Pacheco Pereira for maior do que a totalidade do Pires de Lima? Ou se um quarto dos neurónios do primeiro forem tantos como a média ponderada, pelos anos de militância, do número de neurónios de todos os dirigentes do CDS/PP? Será que 75 mil milhões é um número suficiente para se poder falar de Paulo Portas? Ou serão precisos 80 mil milhões? E já agora, qual é o papel das sinapses nesta história toda?

Por último, não queria deixar de fazer referência ao cérebro de Paulo Portas.

Ao contrário de dirigentes como Pires de Lima, ou Nobre Guedes, Paulo Portas tem muitos neurónios e muitas sinapses. Tem, aliás, muitos mais do que os necessários para produzir os discursos elementares que faz sobre nação, defesa, justiça, imigrantes e solidariedade social.

E é isso que faz dele um político perigoso. Ele sabe exactamente - ao contrário de muitos dos que o rodeiam - que aqueles são discursos elementares que pretendem ressonar com os instintos mais básicos da sociedade portuguesa.

Quem é que imagina que Paulo Portas possa acreditar verdadeiramente no "milagre de Nossa Senhora de Fátima"?

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