sexta-feira, 2 de abril de 2004

A Homenagem na Hora Certa

Assisti, há poucos dias, ao um lançamento de um livro que foi simultaneamente uma lindíssima festa. Não era um romance, embora quase se possa encarar como tal. Era um livro técnico onde o autor enquanto descrevia o seu método de trabalho e respectivos fundamentos ia fazendo deslizar a história da sua vida. O que foi comovente, foi confirmar as centenas de amigos que lhe foram dar um abraço. E digo, amigos, não assistentes a um acontecimento. Poucas vezes na vida tenho sentido vibrar uma emoção com tal densidade que se "via" no ar como um fumo colorido. O leque de idade das pessoas era bastante aberto porque apesar de, naturalmente, predominarem as da idade dele, em fim de carreira, também havia muitos, mas muitos, jovens. Viam-se mesmo algumas crianças levadas pelos pais - até uma neta do próprio autor, bebé de 3 meses! Mas todos ou quase todos se conheciam bem entre si, tratavam-se por tu, diziam as frases da praxe: "Eh pá, aos anos que não te via! Tás na mesma!" ( é sempre bom ouvir isso, mesmo sabendo que não é verdade...)
E o nosso amigo no meio dessa multidão de afecto. Ao chegar ao palco disse "Sinto-me o Wally...!" e estava bem visto, porque quase desaparecia. Mas o que eu queria referir é que talvez alguns dos que ali estavam lhe quisessem dar um abraço especial. Há poucos anos ele teve um AVC grave. Como é uma força da natureza, recuperou magnificamente. Mas os amigos tinham ficado de respiração suspensa. Porque tendo um feitio especialíssimo, que só ele, nós sorrimos, abanamos a cabeça e dizemos: "É mesmo de fulano" com enorme ternura. Ele é ele. Não há ninguém igual. É uma pessoa de tal generosidade, e com um coração tão grande, que mesmo quando não concordamos - e se ele é teimoso! - , rimos e passamos à frente.
Ora era exactamente agora que se justificava a homenagem. Na altura do AVC era de mau gosto, parecia um rebuçado para ajudar à cura. Daqui a 10 ou 20 anos sabe-se lá quantos dos que ali estavam estarão lúcidos e com forças para o tal abraço. Agora sim. Não é um fecho de carreira, que uma carreira daquelas continua sempre aberta, mas um forte agradecimento dos que beneficiaram da sua influência, e aprenderam com ele.
Foi uma tarde inesquecível.

M.L.

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